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Lei 93/2021 vs Diretiva (UE) 2019/1937: Quais as principais diferenças e semelhanças?


 

Lei 93/2021 vs Diretiva (UE) 2019/1937: Quais as principais diferenças e semelhanças?         


                                                                                                                                           Por: Joana Capaz Coelho      

                                                                                                                           






Introdução

A 20 de dezembro de 2021, foi publicada a Lei 93/2021[1] que estabelece o Regime Geral de proteção de denunciantes de infrações, transpondo a Diretiva (UE) 2019/1937 [2] do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2019, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União, para o ordenamento jurídico nacional.

Como sabemos, a 16 de dezembro de 2019 entrou em vigor a Diretiva (UE) 2019/1937 que visa a criação de um conjunto de normas mínimas comuns aos diversos Estados - Membros com o fim de proteger, eficazmente, aqueles que, no contexto profissional (seja este público ou privado), tendo obtido conhecimento de ameaças ou situações lesivas do interesse público, as denunciem.

No plano nacional, a Lei 93/2021, que entrou em vigor a 18 de junho de 2022, pretende ir ao encontro do estipulado na Diretiva (UE) 2019/1937, como veremos.

Lei 93/2021, de 20 de dezembro: âmbito de aplicação material

Relativamente ao âmbito de aplicação material da Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, determina o artigo 2.º que as violações abrangidas pela Lei dizem respeito aos seguintes domínios:

  • Contratação pública (vide subalínea i) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  •  Serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo (vide subalínea ii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  • Segurança e conformidade dos produtos (vide subalínea iii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  • Segurança dos transportes (vide subalínea iv) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  •  Proteção do ambiente (vide subalínea v) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  •  Proteção contra radiações e segurança nuclear (vide subalínea vi) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  •  Segurança dos alimentos para consumo humano e animal, saúde animal e bem-estar animal (vide subalínea vii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  •  Saúde pública (vide subalínea viii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  • Defesa do consumidor (vide subalínea ix) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021);
  •  Proteção da privacidade e dos dados pessoais e segurança da rede e dos sistemas de informação (vide subalínea x) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021).   

Quando comparado com a Diretiva (UE) 2019/1937, verificamos que a redação do artigo 2.º, n.º 1 da Lei n.º 93/2021 é bastante semelhante com a redação do artigo 2.º, n.º 1 da Diretiva (UE) 2019/1937, ora vejamos:

De acordo com o artigo 2.º as violações abrangidas pela Diretiva (UE) 2019/1937 dizem respeito aos seguintes domínios:

  • Contratação Pública (vide subalínea i) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capital e do financiamento ao terrorismo (vide subalínea ii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Segurança e conformidade dos produtos (vide subalínea iii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Segurança dos transportes (vide subalínea iv) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Proteção do ambiente (vide subalínea v) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Proteção contra radiações e segurança nuclear (vide subalínea vi) da al. a) do n.º 1 do 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Segurança dos géneros alimentícios e dos alimentos para animais, saúde e bem-estar animal nuclear (vide subalínea vii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Saúde pública (vide subalínea viii) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Defesa do consumidor (vide subalínea ix) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  • Proteção da privacidade e dos dados pessoais e segurança da rede e dos sistemas de informação (vide subalínea x) da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937).

Decorre ainda da al. b) do n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021 que estão incluídos no seu  âmbito de aplicação material, os atos ou omissões contrários e lesivos dos interesses financeiros da União Europeia (U.E) a que se refere o artigo 325.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)[3], conforme especificado nas medidas da União Europeia aplicáveis  e os  atos ou omissões contrários às regras do mercado interno a que se refere o n.º 2 do artigo 26.º do TFUE[4], incluindo as regras de concorrência e auxílios estatais, bem como as regras de fiscalidade societária (cfr.  al. c) do n.º 1 do artigo 2.º).

Estas alíneas espelham o que consta das als. b) e c) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937.

Para além disto, determina a  al. d) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021 que a criminalidade violenta, especialmente violenta e altamente organizada, bem como os crimes previstos no n.º 1 do artigo 1.º da Lei 5/2002, de 11 de janeiro[5] [estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico - financeira] estão também incluídos no âmbito de aplicação material daquele Diploma.

De acordo com a al. e) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021, os atos ou omissões que contrariem o fim das regras ou normas abrangidas pelas alíneas a) a c) estão também abrangidas pelo âmbito de aplicação material da Lei.

Finalmente, nos domínios da defesa e segurança nacionais, só é considerado infração para efeitos da Lei, o ato ou omissão contrária às regras de contratação constantes dos atos da União Europeia referidos na parte i. A do anexo da Diretiva (UE) 2019/1937, ou que contrariem os fins destas regras (cfr. n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 93/2021).

Estas últimas alíneas não constam da Diretiva (UE) 2019/1937. Todavia, e como estabelece o n.º 2 da Diretiva (UE) 2019/1937: “a presente diretiva aplica-se sem prejuízo da competência de os Estados - Membros alargarem a proteção nos termos do direito nacional no que diz respeito a domínios ou atos não abrangidos pelo n.º 1”.

De modo a esquematizar o que foi dito, apresentamos o seguinte esquema:


ÂMBITO DE APLICAÇÃO MATERIAL

REGIME JURÍDICO

 

COMPARAÇÃO

Artigo 2.º da Lei  93/2021 

Artigo 2.º da Diretiva 2019/1937

Determina o art. 2.º da Lei 93/2021 que as violações abrangidas pela Lei dizem respeito aos seguintes domínios:

Contratação Pública (vide subalínea i) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);


 Serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo (vide subalínea ii) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);

 

 

Segurança e conformidade dos produtos (vide subalínea iii) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);

 

Segurança dos transportes (vide subalínea iv) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);

 

Proteção do ambiente (vide subalínea v) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);


Proteção contra radiações e segurança nuclear (vide subalínea vi) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);

 


Segurança dos alimentos para consumo humano e animal, saúde animal e bem-estar animal (vide subalínea vii) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);

 

Saúde pública (vide subalínea viii) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);

 

Defesa do consumidor (vide subalínea ix) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021);

 


Proteção da privacidade e dos dados pessoais e segurança da rede e dos sistemas de informação (vide subalínea x) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021).

 

 

Ao mesmo tempo, determina a al. b) do n.º 1 do art. 2.º da Lei 93/2021 que os atos ou omissões contrárias e lesivas dos interesses financeiros da União Europeia a que se refere o artigo 325.º do TFUE, conforme especificado nas medidas da União Europeia aplicáveis encontram-se incluídas no âmbito de aplicação material da Lei.

 

 

 

Para além disto, estipula a al. c) do n.º 1 do art.2.º da Lei 93/2021 que, os atos ou omissões contrárias às regras do mercado interno a que se refere o n.º 2 do artigo 26.º do TFUE, incluindo as regras de concorrência e auxílios estatais, bem como as regras de fiscalidade societária estão incluídas no âmbito material da Lei.

 

 

 

 


Ao mesmo tempo, nos termos da al. d) do n.º 1 do art 2.º da Lei 93/2021, a criminalidade violenta, especialmente violenta e altamente organizada, bem como os crimes previstos no n.º 1 do artigo 1.º da Lei 5/2002, de 11 de janeiro encontra-se consagrados no âmbito material da Lei e, finalmente,

Estipula a al. e) que os atos ou omissões contrariam aos fins das  regras ou normas abrangidas pelas alíneas a) a c) encontram-se no âmbito material da Lei.

De acordo com o art. 2.º da Diretiva 2019/1937, esta aplica-se às infrações cometidas nos seguintes domínios

       Contratação Pública (vide subalínea i) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937); 

Serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capital e do financiamento ao terrorismo (vide subalínea ii) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

 

Segurança e conformidade dos produtos (vide subalínea iii) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);


Segurança dos transportes (vide subalínea iv) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

 

       Proteção do ambiente (vide subalínea v) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º Diretiva (UE) 2019/1937);

   Proteção contra radiações e segurança nuclear (vide subalínea vi) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º Diretiva (UE) 2019/1937.º 1, al. vi) do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

    

    Segurança dos géneros alimentícios e dos alimentos para animais, saúde e bem-estar animal nuclear (vide subalínea vii) da al. a) do n.º 1 do art 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

     Saúde pública (vide subalínea viii) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

    

    Defesa do consumidor (vide subalínea ix) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

 

   Proteção da privacidade e dos dados pessoais e segurança da rede e dos sistemas de informação (vide subalínea x) da al. a) do n.º 1 do art. 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937).

 

Determina a al. b) da Diretiva (UE) 2019/1937 que, as violações lesivas dos interesses financeiros da União, a que se refere o artigo 325.º do TFUE e especificadas nas medidas da União aplicáveis encontram-se incluídas no âmbito de aplicação material do Diploma.

 

 

 

De acordo com a al. c) do artigo 2.º da Diretiva (UE) 2019/1937, as violações relacionadas com o mercado interno, a que se refere o artigo 26.º, n.º 2, do TFUE, inclusive violações das regras da União de concorrência e de auxílios estatais, bem como violações relacionadas com o mercado interno relativamente a atos que violem normas de fiscalidade societária ou a práticas cujo objetivo seja a obtenção de vantagens fiscais que contrariem o objetivo ou a finalidade do direito fiscal societário encontram-se incluídas no escopo do Diploma.

 

 

 

 

 

 

 

 


Estipula o n.º 2 da Diretiva (UE) 2019/1937 que a Diretiva aplica-se sem prejuízo da competência de os Estados-Membros alargarem a proteção nos termos do direito nacional no que diz respeito a domínios ou atos não abrangidos pelo n.º 1.

As normas que tratam do âmbito de aplicação quer da Lei 93/2021 quer da Diretiva (UE) 2019/1937 são, em termos gerais, equivalentes.

 

Aliás, o art. 2.º, n.º 1 da Lei 93/2021 e o art. 2.º, n.º 1 da Diretiva (UE) 2019/1937 são praticamente iguais.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 





A al. b) do artigo 2. º Lei 93/2021 e da Diretiva (UE) 2019/1937 são semelhantes e ambos tratam a matéria das violações lesivas dos interesses financeiros da União, a que se refere o artigo 325.º do TFUE.

 

Ao mesmo tempo, também a al. c) do artigo 2. º da Lei 93/2021 e da Diretiva (UE) 2019/1937 são equivalentes, na medida em que se focam nas violações relacionadas com o mercado interno, a que se refere o artigo 26.º, n.º 2, do TFUE.




Uma das diferenças prende-se com o facto de a Lei nacional ter ido mais longe e acrescentado a al. d) e e).

 

 

 

Note-se, contudo, que nos termos do 2.º do artigo 2.º da Diretiva é estabelecido exatamente a possibilidade de os EM poderem alargar o âmbito de aplicação do diploma.

 

Lei 93/2021, de 20 de dezembro: âmbito de aplicação subjetivo

O âmbito de aplicação subjetiva da Lei 93/2021, de 20 de dezembro encontra-se regulado no artigo 5.º da Lei.

Estipula o n.º 1 do artigo 5.º da Lei 93/2021 que: “A pessoa singular que denuncie ou divulgue publicamente uma infração com fundamento em informações obtidas no âmbito da sua atividade profissional, independentemente da natureza desta atividade e do setor em que é exercida, é considerada denunciante”.

Por seu turno, a Diretiva (UE) 2019/1937 no seu artigo 4.º, n.º 1 determina que: “A presente diretiva aplica-se a denunciantes que, trabalhando no setor público ou privado, tenham obtido informações sobre violações em contexto profissional (…)”.

 De acordo com o n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021, considera-se denunciantes, designadamente:

  •  Os trabalhadores do setor privado, social ou público (vide al. a) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021);
  • Os prestadores de serviços, contratantes, subcontratantes e fornecedores, bem como quaisquer pessoas que atuem sob a sua supervisão e direção (vide al. b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021);
  •  Os titulares de participações sociais e as pessoas pertencentes a órgãos de administração ou de gestão ou a órgãos fiscais ou de supervisão de pessoas coletivas, incluindo membros não executivos (vide al. c) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021);
  • Voluntários e estagiários, remunerados ou não remunerados (vide al. d) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021).

Já a Diretiva (UE) 2019/1937, no seu artigo 4.º, n.º 1 dispõe que são denunciantes, nomeadamente:

  •  Os trabalhadores, na aceção do artigo 45.º, n.º 1, do TFUE, incluindo trabalhadores públicos (cfr. n.º 1, al. a) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937);
  •        Não assalariados, na aceção do artigo 49.º do TFUE (cfr. n.º 1, al. b) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

  • Titulares de participações sociais e pessoas pertencentes a órgãos de administração, de gestão ou de supervisão de empresas, incluindo membros não executivos, assim como voluntários e estagiários remunerados ou não remunerados (cfr. n.º 1, al. c) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937) e, ainda;
  •       Quaisquer pessoas que trabalhem sob a supervisão e a direção de contratantes, subcontratantes e fornecedores (cfr. n.º 1, al. d) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937).

Pelo que, a redação do n.º 1 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937 e do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021, apesar de conterem ligeiras diferenças na forma como estão redigidos, são bastante semelhantes no seu conteúdo.

Por fim, nos termos do n.º 3 do artigo 5.º da Lei 93/2021: “Não obsta à consideração de pessoa singular como denunciante a circunstância de a denúncia ou de a divulgação pública de uma infração ter por fundamento informações obtidas numa relação profissional entretanto cessada, bem como durante o processo de recrutamento ou durante outra fase de negociação pré - contratual de uma relação profissional constituída ou não constituída”.

A Diretiva (UE) 2019/1937 cobre, também, os denunciantes que comuniquem informações sobre violações obtidas numa relação profissional que já tenha terminado (n.º 2 do artigo 4.º) e os denunciantes cuja relação profissional ainda não se tenha iniciado, nos casos em que se tenha cometido violações durante o processo de recrutamento ou noutra fase de negociação pré-contratual (n.º 3 do artigo 4.º).

Significa isto que, também a Diretiva (UE) 2019/1937 se aplica a sujeitos que obtenham conhecimento de violações praticadas dentro do seu seio profissional e não a pessoas estranhas a esse contexto profissional, salvo exceções.

Em suma:

ÂMBITO DE APLICAÇÃO SUBJETIVA

 

REGIME JURÍDICO

 

COMPARAÇÃO

Artigo 5.º da Lei 93/2021

Artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937

De acordo com o n.º 1, do art. 5.º da Lei 93/2021, a Lei aplica-se às pessoas singulares que denunciem ou divulguem publicamente uma infração com fundamento em informações obtidas no âmbito da sua atividade profissional, independentemente da natureza desta atividade e do setor em que é exercida, é considerada denunciante.

 

 

Ao mesmo tempo, para efeitos do n.º2 do artigo 5.º da Lei 93/2021, são considerados denunciantes:

Os trabalhadores do setor privado, social ou público (vide al. a) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021);

 

Os prestadores de serviços, contratantes, subcontratantes e fornecedores, bem como quaisquer pessoas que atuem sob a sua supervisão e direção (vide al. b) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021);

 

 

 

Os titulares de participações sociais e as pessoas pertencentes a órgãos de administração ou de gestão ou a órgãos fiscais ou de supervisão de pessoas coletivas, incluindo membros não executivos (vide al. c) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021);

 

Voluntários e estagiários, remunerados ou não remunerados  (vide al. d) do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021).

 

 

 







 Finalmente, de acordo com o n.º 3 do artigo 5.º do mesmo diploma, não obsta à consideração de pessoa singular como denunciante a circunstância de a denúncia ou de a divulgação pública de uma infração ter por fundamento informações obtidas numa relação profissional entretanto cessada, bem como durante o processo de recrutamento ou durante outra fase de negociação pré-contratual de uma relação profissional constituída ou não constituída é relevante para efeitos da Lei.

 

Determina o n.º 1 do art.4.º da Diretiva (UE) 2019/1937 que   esta destina-se a denunciantes que, trabalhando no setor público ou privado, tenham obtido informações sobre violações em contexto profissional.

 

 

 

 

Para além disto, são denunciantes para efeitos do n.º 1 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937, nomeadamente:


Os trabalhadores, na aceção do artigo 45.º, n.º 1, do TFUE, incluindo trabalhadores públicos (cfr. n.º 1, al. a) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

 



Não assalariados, na aceção do artigo 49.º do TFUE (cfr. n.º 1, al. b) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

 



Titulares de participações sociais e pessoas pertencentes a órgãos de administração, de gestão ou de supervisão de empresas, incluindo membros não executivos, assim como voluntários e estagiários remunerados ou não remunerados (cfr. n.º 1, al. c) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937) e, ainda;

 

Quaisquer pessoas que trabalhem sob a supervisão e a direção de contratantes, subcontratantes e fornecedores (cfr. n.º 1, al. d) do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937).

 

 

De acordo com o n.º 3 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937, esta aplica-se igualmente a denunciantes cuja relação profissional se não tenha ainda iniciado, nos casos em que tenham obtido as informações sobre violações durante o processo de recrutamento ou noutras fases de negociação pré-contratual.

 

 

 

 

Por fim, estipula o n.º 4 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937,  que, as medidas de proteção dos denunciantes estabelecidas no capítulo VI são igualmente aplicáveis, se for caso disso,

a:

a) Facilitadores (vide al.a) do n.º 4 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

b) Terceiros que estejam ligados aos denunciantes e que possam ser alvo de retaliação num contexto profissional, tais como colegas ou familiares dos denunciantes (vide al. b) do n.º 4 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937);

c) Entidades jurídicas que sejam detidas pelos denunciantes, para as quais os denunciantes trabalhem ou com as quais estejam de alguma forma ligados num contexto profissional (vide al. c) do n.º 4 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937).

A Lei 93/2021 no seu artigo 5.º, n.º 1 define o conceito de denunciante num n.º autónomo, ao contrário do que acontece com a Diretiva (UE) 2019/1937 no seu artigo 4.º.

 

 

  A redação do n.º 1 do art. 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937 e do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 93/2021, apesar de conterem ligeiras diferenças na forma como estão redigidos, são bastante semelhantes no seu conteúdo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 





O n.º 3 do artigo 4.º da Diretiva (UE) 2019/1937 e o n.º 3 do artigo 5.º da Lei 93/2021 são equivalentes.

 

 

 

 


O conteúdo do n.º 4 do artigo 4.º da Diretiva  (UE) 2019/1937 não consta do artigo 3 da Lei 93/2021), mas do artigo seguinte.


Lei 93/2021, de 20 de dezembro: condições de proteção do denunciante

Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da Lei 93/2021: “Beneficia da proteção conferida pela presente lei o denunciante que, de boa-fé, e tendo fundamento sério para crer que as informações são, no momento da denúncia ou da divulgação pública, verdadeiras, denuncie ou divulgue publicamente uma infração nos termos estabelecidos no capítulo ii”.

Nesta ambiência, para que se beneficie da proteção conferida pela Lei, necessitam de se encontrar preenchidos os seguintes requisitos:

  •        O denunciante necessita de estar de boa-fé;
  •     O denunciante deve ter um fundamento sério para crer que as informações são, no momento da denúncia ou da divulgação pública, verdadeiras e;
  •       O denunciante tem de denunciar ou divulgar publicamente uma infração nos termos estabelecidos no capítulo ii.

Da maior importância é o n.º 2 do artigo 6 da Lei 93/2021 que estabelece que: “o denunciante anónimo que seja posteriormente identificado beneficia da proteção conferida pela presente lei, contanto que satisfaça as condições previstas no número anterior” e, ainda, o n.º 3 que estabelece que: “o denunciante que apresente uma denúncia externa sem observar as regras de precedência previstas nas alíneas a) a e) do n.º 2 do artigo 7.º beneficia da proteção conferida pela presente lei se, aquando da apresentação, ignorava, sem culpa, tais regras”.

Já de acordo com o n.º 4 do artigo 6.º da Lei 93/2021, determina-se que a proteção conferida pela Lei é extensível, com as devidas adaptações, a:

  •  Pessoa singular que auxilie o denunciante no procedimento de denúncia e cujo auxílio deva ser confidencial, incluindo representantes sindicais ou representantes dos trabalhadores (cfr. al. a) do n.º 4 do artigo 6.º da Lei 93/2021);
  • Terceiro que esteja ligado ao denunciante, designadamente colega de trabalho ou familiar, e possa ser alvo de retaliação num contexto profissional (cfr. al. b) do n.º 4 do artigo 6.º da Lei 93/2021);
  • Pessoas coletivas ou entidades equiparadas que sejam detidas ou controladas pelo denunciante, para as quais o denunciante trabalhe ou com as quais esteja de alguma forma ligado num contexto profissional (cfr. al. b) do n.º 4 do artigo 6.º da Lei 93/2021).

Estabelece o n.º 5 da Lei 93/2021 que o denunciante que apresente uma denúncia de infração às instituições, órgãos ou organismos da União Europeia competentes beneficia da proteção estabelecida na presente lei nas mesmas condições que o denunciante que apresenta uma denúncia externa.

O Artigo 6.º da Diretiva (UE) 2019/1937 estabelece, também ele, as condições para a proteção dos denunciantes, estabelecendo, designadamente, que os denunciantes beneficiam de proteção desde que:

  •       Tenham tido motivos razoáveis para crer que as informações sobre violações comunicadas eram verdadeiras no momento em que foram transmitidas e que estavam abrangidas pelo âmbito de aplicação da presente diretiva (vide al. a) do n.º 1 do artigo 6 da Diretiva (UE) 2019/1937) e;
  • Tenham denunciado internamente, nos termos do artigo 7.º, ou externamente, nos termos do artigo 10.º, ou realizado uma divulgação pública, nos termos do artigo 15.º (vide, al. b) do n.º 1 do artigo 6 da Diretiva (UE) 2019/1937).

Voltaremos a este tema nos próximos Posts. Fica atento!!

Sugestão de citação: J. C. Coelho, " Lei 93/2021 vs Diretiva (UE) 2019/1937: Quais as principais diferenças e semelhanças?", 19th June, 19 de setembro de 2022.



[5] Determina o n.º 1 do artigo 1 da Lei 5/2002, de 11 de janeiro que:

“1 - A presente lei estabelece um regime especial de recolha de prova, quebra do segredo profissional e perda de bens a favor do Estado, relativa aos crimes de:

a) Tráfico de estupefacientes, nos termos dos artigos 21.º a 23.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro;

b) Terrorismo, organizações terroristas, terrorismo internacional e financiamento do terrorismo;

c) Tráfico de armas;

d) Tráfico de influência;

e) Recebimento indevido de vantagem;

f) Corrupção ativa e passiva, incluindo a praticada nos setores público e privado e no comércio internacional, bem como na atividade desportiva;

g) Peculato;

h) Participação económica em negócio;

i) Branqueamento de capitais;

j) Associação criminosa;

l) Pornografia infantil e lenocínio de menores;

m) Dano relativo a programas ou outros dados informáticos e a sabotagem informática, nos termos dos artigos 4.º e 5.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, e ainda o acesso ilegítimo a sistema informático, se tiver produzido um dos resultados previstos no n.º 4 do artigo 6.º daquela lei, for realizado com recurso a um dos instrumentos referidos ou integrar uma das condutas tipificadas no n.º 2 do mesmo artigo;

n) Tráfico de pessoas;

o) Contrafação, uso e aquisição de cartões ou outros dispositivos de pagamento contrafeitos e respetivos atos preparatórios, aquisição de cartões ou outros dispositivos de pagamento obtidos mediante crime informático, dano relativo a programas ou outros dados informáticos e sabotagem informática, nos termos dos artigos 3.º-A, 3.º-B, 3.º-C, 3.º-D, 3.º-E, 4.º e 5.º da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, e ainda o acesso ilegítimo a sistema informático, se tiver produzido um dos resultados previstos nas alíneas a) e b) do n.º 5 do artigo 6.º daquela lei, for realizado com recurso a um dos instrumentos referidos no n.º 2 do mesmo artigo, ou integrar uma das condutas aí tipificadas;

p) Lenocínio;

q) Contrabando;

r) Tráfico e viciação de veículos furtados”.



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