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O Dia Internacional da Educação: de Direito Universal a Pilar da Agenda 2030

 

O Dia Internacional da Educação: de Direito Universal a Pilar da Agenda 2030


  Artigo redigido em coautoria  por:  

Raúl Capaz Coelho                                                                                                                                  Joana Capaz Coelho

                                     




O Dia Internacional da Educação, instituído pela Resolução 73/25 da Assembleia Geral das Nações Unidas em 2018 e celebrado anualmente a 24 de janeiro, visa ressalvar o papel absolutamente estruturante da Educação na construção da paz, na promoção dos direitos humanos e na erradicação da pobreza, constituindo, ademais, um impulso à reflexão sobre o papelcentral da Educação no progresso dos povos e no fortalecimento das sociedades.

Pela sua particular relevância, a Educação tem sido objeto de previsão nos múltiplos instrumentos de direito internacional e de consagração nas diversas legislações nacionais.

O Direito Humano à Educação encontra-se, desde logo, estabelecido no artigo 26.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) de 1948, nos seguintes termos: "1. Toda a pessoa tem direito à educação. (…) 2. A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz (…)"[1].

O Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais de 1966 (PIDESC), dedicou-lhe os artigos 13.º e 14.º, de que destaca o n.º 1 do artigo 13.º: “os Estados-Signatários no presente Pacto reconhecem o direito de toda a pessoa à educação. Concordam que a educação deve ser orientada até ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e do sentido da sua dignidade e deve fortalecer o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais. Concordam deste modo, que a educação deve capacitar todas as pessoas para participar efetivamente numa sociedade livre, favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e entre todos os grupos raciais, étnicos e religiosos e promover as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz”[2]. 

O PIDESC, alinhando-se com o DUDH, veio estabelecer que Educação é um direito de todos e deve ter como objetivo não só o desenvolvimento da personalidade humana, mas, também, o incremento do respeito pelos Direitos Humanos e liberdades fundamentais, visando capacitar o indivíduo a participar numa sociedade que se pretende plural.

Em Portugal, o Direito à Educação está protegido pelo artigo 73.º Constituição da República Portuguesa (CRP), que consagra que todos têm Direito à Educação, sem discriminação, sublinhando o papel do Estado na democratização do ensino e na promoção da igualdade de oportunidades.

A Educação é, aliás, frequentemente, descrita como um direito de empoderamento. Segundo Vital Moreira e Carla de Marcelino Gomes (2013, p. 277): “tal direito confere ao indivíduo mais controlo no percurso da sua vida, e, em particular, mais controlo sobre o efeito das ações do Estado em si. Por outras palavras, exercer um direito de empoderamento permite à pessoa experienciar os benefícios de outros direitos”[3].

 A Educação é mais do que a simples aquisição de conhecimentos. É uma ferramenta transformadora que permite aos indivíduos desenvolverem competências, compreenderem o mundo em que vivem e tornarem-se agentes ativos na sociedade.

Como afirmou Nelson Mandela, A educação é a arma mais poderosa que podemos usar para mudar o mundo. Através da Educação, criam-se as condições indispensáveis para o desenvolvimento sustentável, a mitigação das desigualdades e a promoção de sociedades mais justas e inclusivas.

De destacar, ainda, o papel da Educação na concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030, adotada pela ONU em 2015.

Esta Agenda, composta por 17 objetivos, define as principais prioridades para o desenvolvimento sustentável global até 2030, promovendo a mobilização de esforços conjuntos a nível mundial em torno de metas e propósitos comuns.

O ODS 4, dedicado à Educação, visa garantir uma educação inclusiva, equitativa e de qualidade, promovendo oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos. A educação de qualidade é, portanto, a chave para o alcance de outros ODS, como a erradicação da pobreza (ODS 1), a promoção da saúde e bem-estar (ODS 3), a igualdade de género (ODS 5) e a redução das desigualdades (ODS 10). Através da Educação, as comunidades podem desenvolver soluções criativas e inovadoras para enfrentar desafios globais, como as mudanças climáticas (ODS 13) e a promoção de sociedades pacíficas (ODS 16).

Deste modo, a Educação, como referido supra, vai além da mera aquisição de conhecimentos: é a base para a construção de sociedades sustentáveis e resilientes. Ao investir na Educação, estamos a promover a capacidade dos indivíduos e das comunidades para enfrentar os desafios do futuro, a mitigar os impactos das desigualdades e a criar um mundo mais justo e equilibrado para todos.

O acesso universal à Educação é uma condição essencial para a construção de uma sociedade global inclusiva e sustentável. A implementação de políticas públicas eficazes, que garantam a qualidade do ensino e o acesso equitativo à educação, é uma responsabilidade compartilhada por todos!

O Dia Internacional da Educação realça a importância da Educação no desenvolvimento dos Povos, mas, sobretudo, deve fazer-nos refletir sobre que futuro pretendemos enquanto sociedade e qual o papel que a Educação deve desempenhar na sua construção.



[1] Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, disponível para consulta em https://dre.pt/declaracao-universal-dos-direitos-humanos  (consultado a 18/01/2025).

[2] Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais de 1966, disponível para consulta em https://www.dge.mec.pt/sites/default/files/ECidadania/educacao_para_a_Defesa_a_Seguranca_e_a_Paz/documentos/pacto_internacional_sobre_direitos_economicos_sociais_culturais.pdf  (consultado a 18/01/2025).

[3] MOREIRA, Vital e GOMES, Carla de Marcelino (Coord.s) (2013), “Compreender os Direitos Humanos” pág.227.



 


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